Governo vai recorrer de ação que paralisa Porto do Mercosul 03/09/2008 - 10:10

A procuradoria-geral do Estado trabalha para derrubar decisão liminar que paralisou o planejamento para a construção do Porto do Mercosul, na Ponta do Poço, em Pontal do Paraná. “Estamos trabalhando para trazer a questão para a justiça do Paraná. É aqui que temos de discutir a desapropriação de terras declaradas de utilidade pública pelo Governo do Paraná”, disse nesta terça-feira (2) o procurador-geral do Estado, Carlos Frederico Marés. “Declarar uma área como de interesse público é prerrogativa da administração pública, e não está submetida (a questionamento judicial) a não ser que haja forte desvio de finalidade”, falou.

A procuradoria-geral do Estado trabalha para derrubar decisão liminar concedida pela Justiça Federal de Brasília a um empresário que paralisou o planejamento para a construção do Porto do Mercosul, na Ponta do Poço, em Pontal do Paraná. “Estamos buscando trazer a questão para a justiça do Paraná. É aqui que temos de discutir a desapropriação de terras do Estado declaradas de utilidade pública pelo Governo do Paraná”, informou nesta terça-feira (2) o procurador-geral do Estado, Carlos Frederico Marés.

Para implementar o Porto do Mercosul, o governador Roberto Requião decretou em maio a utilidade publica de 2,25 milhões de metros quadrados de terras na Ponta do Poço. Proprietário de parte da área, o empresário João Carlos Ribeiro recorreu à Justiça em Brasília pedindo a revogação do decreto de utilidade pública.

“Declarar uma área como de interesse público é prerrogativa da administração pública, e não está submetida (a questionamento judicial) a não ser que haja forte desvio de finalidade”, rebateu o procurador-geral. “A desapropriação não é um instituto jurídico recente, surgiu com o Estado constitucional para permitir ao Estado organizar o espaço territorial, construir obras públicas e transformar terras e imóveis particulares em áreas de interesse público”, disse.

Após decretar a utilidade pública do imóvel, o governo tem cinco anos para implementar a desapropriação, quer seja num acordo em que o Estado paga o valor definido entre as partes, quer seja via ação judicial.

ENTENDA O CASO — João Carlos Ribeiro alega ter contrato de adesão com o governo federal para construir um porto privado na Ponta do Poço. Mas tal contrato, firmado em 1995 com a Porto Pontal, empresa que Ribeiro comprou em 2006, caducou, porque a União não recebeu qualquer projeto para o futuro terminal.

Além disso, o documento concedia licença para um porto de 130 mil metros quadrados — o porto privado cujo projeto Ribeiro diz ter pronto teria área de 1 milhão de metros quadrados. Ou seja — ainda que não houvesse caducado, o documento não autoriza a execução do projeto atual.

Há mais problemas no projeto da Porto Pontal. A licença concedida pelo governo federal em 1995 determinava uma consulta formal à Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (Appa), concessionária do serviço portuário no Paraná. Ela nunca foi realizada, entretanto.

A área também não possui Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto Organizado (PDZPO), item obrigatório para o desenvolvimento do projeto. Sem toda a documentação em ordem, a empresa não poderia sequer ter pleiteado licença ambiental para utilizar a área.

A Secretaria Especial da Portos do governo federal prepara decreto que irá regulamentar a construção de novos terminais em todo o País. Sob o novo regulamento, não bastará ser proprietário de área costeira e ter em mãos projeto e financiamento para a construção de um terminal. Será obrigatório abrir concorrência pública federal para a realização da obra.

Antes disso, a União irá analisar o projeto, e só deverá autorizar a concorrência se concluir que o novo porto está de acordo com o planejamento estratégico de desenvolvimento do sistema portuário brasileiro. Ou seja — se o local não for considerado prioritário para a instalação de um novo terminal, ele não terá a construção autorizada, ainda que haja terreno, dinheiro e projeto para tanto.

Ainda assim, Ribeiro recorreu aos tribunais da capital federal, alegando que o contrato de adesão — já vencido — determinaria que a justiça brasiliense deveria tratar de quaisquer disputas jurídicas sobre a área.

IDEOLOGIZAÇÃO — Na petição que resultou na liminar, os advogados de João Carlos Ribeiro alegam que há desvio de finalidade na declaração de utilidade pública, incompetência do Estado pela existência da concessão das áreas pela União para particulares, ilegalidade dos motivos e ausência de publicidade adequada.

“Mas, na argumentação, tudo isso se reduz ao ódio do capital contra o bom serviço publico que o estado pode prestar”, lamentou Marés. “Tome-se o que diz a petição, preparada pelo escritório de Candido Rangel Dinamarco — ‘A verdadeira mola propulsora do Governo do Estado do Paraná é a aversão à prestação de serviços públicos pela iniciativa privada, é a fúria reestatizadora que sempre marcou a administração do excelentíssimo governador Roberto Requião’”, acrescentou.

“Segue a petição — ‘Trata-se de uma ideologia política que ele tenta sobrepor aos contratos vigentes (e) ao que diz a legislação e em ultima análise a segurança jurídica’. Daqui em diante, o argumento da ação não será nenhuma exegese jurídica, mas tão somente uma critica ao fato do Governo do Paraná não ter privatizado a Copel, a Sanepar. Mesmo a tentativa de recuperar as rodovias do Paraná estão na ação”, disse o procurador-geral.

O PROJETO PÚBLICO — O governador assinou no dia 30 de maio os decretos de utilidade pública de 2,25 milhões de metros quadrados na costa da Ponta do Poço para a construção do Porto do Mercosul. Os decretos determinam a desapropriação de sete áreas particulares para a construção da estrutura terrestre de um moderno porto destinado a concentrar cargas e linhas de navegação.

A Appa irá financia a obra, que tem em investimento previsto de R$ 400 milhões. A escolha de Pontal do Poço para a construção do Porto do Mercosul é estratégica. Ali, o oceano tem profundidade média de 21 metros. Além disso, é mais próximo do mar aberto — desde a entrada da barra, os navios levarão uma hora a menos para chegar ali em comparação a Paranaguá.

“Com essa profundidade e uma dragagem eficiente no Canal da Galheta, teríamos o maior e mais eficiente porto do Brasil, e um terminal de transbordo no Porto do Mercosul, para a atracação de navios de grande porte com cargas destinadas a países latino-americanos que têm portos fluviais de baixo calado. Ali se faria o transbordo das cargas para navios menores”, explicou Requião.

Desde a assinatura dos decretos, a Appa trabalha no licenciamento ambiental da obra e na avaliação das áreas que serão desapropriadas. Ao todo, são sete terrenos que pertencem a particulares e somam 2,25 milhões de metros quadrados.

“Temos apoio de proprietários de áreas próximas ao empreendimento público, que nos ofereceram seus terrenos que o porto fosse iniciado imediatamente. Mais do que nunca, é preciso que se quebrem as barreiras políticas e que a comunidade se mobilize”, argumentou à época o superintendente da Appa, Eduardo Requião.

(BOX)
Terreno do Porto do Mercosul foi doado a grupo privado no governo Lupion

A área em que será construído o Porto Público do Mercosul pertence a grupos privados — por isso, foi declarada de utilidade pública pelo governador Roberto Requião. Há mais de 50 anos, entretanto, pertenciam ao Estado. Isso mudou em 1952, quando o governador Moisés Lupion doou a área de quase 50 milhões de metros quadrados a uma empresa chamada Balneário Pontal do Sul.

Um dos donos da empresa era o pai de João Carlos Ribeiro, que também foi secretário de Finanças durante o governo Lupion. Com a morte do pai, Ribeiro vendeu parte das terras à Odebrecht e à Praticagem de Paranaguá.

Outra parte das terras foi vendida à Porto Pontal, que em 1995 obteve licença para construir um porto de 130 mil metros quadrados — que nunca saiu do papel. Por isso, a licença caducou. Em 2006, João Carlos Ribeiro recomprou a parte pertencente à Porto Pontal, buscando explorar a licença.

As concessões de terras do governo Moisés Lupion foram o estopim de grandes conflitos fundiários que se estenderam por décadas em todo o Paraná. Além de governador, Lupion era dono da Cipla, empresa que revendia áreas devolutas cultivadas por posseiros.

A prática levada a cabo por Lupion gerou passagens do folclore político — a Cipla teria até mesmo vendido a área de uma praça pública no interior — e dezenas de conflitos fundiários e mortes durante a colonização do Paraná. A atuação de Lupion foi causa direta de duas revoltas armadas de posseiros, em Porecatu, Norte do Estado, em 1950, e Francisco Beltrão, Pato Branco e Capanema, no Sudoeste, em 1957.

Procurador-geral do Estado, Carlos Frederico Marés Foto: Arnaldo Alves-SECS